31.10.09

CRÓNICA DE UM BANQUEIRO ( V )



A Bolsa


Desde o final dos anos 60, a Bolsa de Valores de Lisboa era palco da maior especulação. Mas em 1973/74 atingiu-se o delírio. Jorge de Brito era o campeão.

Quando o ministro das finanças, alarmado, lhe pediu explicações, Brito ter-lhe-à respondido:
"anda gente a comprar acções sem ter dinheiro e outra a vender sem ter acções".

Os títulos, em papel, demoravam muitos dias a ser entregues. E esse era só um dos truques.

No exercício de 1973, 5 empresas - Barranquinho, Crastos, Caramujeira, Albandeira e Vale de Engenho - apresentaram exactamente o mesmo lucro: 1.007.157$50. No mesmo dia tinham comprado e vendido os mesmos títulos. Comprador? - J. Brito. Vendedor? - J. Brito.

Jorge de Brito faz ganhar algum dinheiro aos trabalhadores do BIP e a muitas outras pessoas - vende-lhes acções que recompra pouco depois e volta a vender muito mais caro. Com estes movimentos faz subir as cotações e quando tal não é suficiente põe o próprio banco a comprar caro para forçar a alta.
Assim se gerava a grande euforia.

O BIP atinge cotações irreais, duplicando o valor dos grandes bancos. A última cotação de 1973, a 26 de Dezembro, foi de 17.000$00. A 23 de Novembro tinha sido de 35.000$00.

Era o grande carrossel. Com as vítimas do costume.

30.10.09

CRÓNICA DE UM BANQUEIRO ( I V )


Assalto à mão armada

A partir do Augustine Reis/BIP, Jorge de Brito lança-se numa corrida desenfreada de compra de empresas. Algumas tinham valor mas outras serviam apenas para montar operações de compra e venda de acções. Dizia-se que estava a comprar Portugal.

Em alguns meses Brito detém 100% de do capital de 24 sociedades e domina mais 13 além de diversas participações minoritárias. Alguma industria, muito imobiliário.
Tudo em seu nome. Tudo pago pelo banco. Primeiro com os recursos disponíveis depois com empréstimos contraídos pela instituição. Muitos pagamentos de empresas foram efectuados contra a entrega de certificados de depósitos a prazo, obviamente falsos, pois não havia entrada de dinheiro correspondente.

Como coroa de glória, Jorge de Brito compra a Sociedade Nacional de Tipografia, proprietária do jornal " O Século"por 344.000 contos. Com recurso a um descoberto no BIP.

Brito justifica esta compra dizendo que precisa ter uma arma.

29.10.09

CRÓNICA DE UM BANQUEIRO ( III )


Pêlo do mesmo cão

Augustine Reis & Cia era uma pequena casa bancária, conservadora, prestigiada e vocacionada para a gestão de fortunas.

O choque com o empregado Jorge de Brito era inevitável.

Os tempos corriam de feição para Brito e não para a família Reis.

Em 31 de Dezembro de 1970, por 335.700 contos, Jorge de Brito compra a Augustine Reis,
que tinha então um capital social de 55.000 contos.

Em 14 de Março de 1972, apesar da oposição de muitos responsáveis, a casa bancária passa a banco - o Banco Intercontinental Português, com um capital de 370.000 contos.

Só era difícil convencer os donos dos bancos a venderem. O pagamento era muito fácil e utilizava-se sempre a receita "pêlo do mesmo cão" - paga-se depois de estar dentro do banco, com o dinheiro que lá se encontra.

28.10.09

CRÓNICA DE UM BANQUEIRO ( ll )



grandes negócios

Jorge de Brito ao jornal Independente: " a minha palavra valia ouro " ; "as pessoas acreditavam cegamente em mim ".

Podia ter acrescentado que, aos balcões do BES e depois da Augustine Reis, tinha acesso a informação privilegiada que usava constantemente em proveito próprio.

Com requintada habilidade, conseguia participar nos grandes negócios de acções, a título pessoal, como intermediário, como comprador e como vendedor.

Foi assim com a Companhia de Cervejas Estrela - ao negociar as acções da família Beirão da Veiga conseguiu, como contrapartida, comprar a velha fábrica do Campo Pequeno. Além disso, cobrou a bela comissão de 8.000 contos.

Foi assim com a compra do Banco Lisboa & Açores pelo Totta Aliança. Actuou como intermediário dos Melos, como comprador da Soc. Comercial Abel Pereira da Fonseca (grande accionista do Lisboa & Açores além de outros negócios) e como vendedor aos mesmos Melos que lhe tinham emprestado o dinheiro. Desde vez acumulou ganhos de 200.000 contos. Para desespero dos Melos que nunca pensaram que o testa-de-ferro lhes saísse tão caro.

27.10.09

CRÓNICA DE UM BANQUEIRO ( l )


Os papéis da velha

Filho do colega da ourivesaria, Jorginho era conhecido e estimado pelos comerciantes da baixa de Lisboa. Ainda hoje os mais velhos o recordam e gostam de contar a história do início da sua carreira de banqueiro.

Jovem e promissor, Jorginho ingressou cedo na banca e acertou logo no alvo - o balcão de títulos do Banco Espírito Santo.

A primeira oportunidade surgiu quando a viúva de um capitalista, velha conhecida dos comerciantes da baixa, chegou ao banco com um grande pacote de títulos antigos, presumivelmente desvalorizados.

Que sim e pois, devia estar quase tudo caducado, o jovem bancário pediu alguns dias à cliente para analisar os títulos e tentar salvar o que fosse possível.

No prazo combinado tudo estava tratado, a velha senhora recebeu, agradecida, um cheque modesto, e o futuro banqueiro entrou no clube dos bem-aventurados.

Durante muito tempo, quando passava na baixa, Jorge de Brito ouvia da porta das lojas:
Oh Jorginho olha a velha! Oh Jorginho olha os papéis da velha!