31.8.09

CRÓNICAS DO CHÁ ( V )

a última baixa

No Chá Madal sofremos a nossa última baixa. Estúpida como todas as mortes aos vinte anos. Ainda mais estúpida por pertencer àquela guerra estúpida.
E também por ter ficado relacionada com um momento bom, como era o futebol.

O cabo P. estava equipado a preceito, já não sei se "à Porto" ou "à Benfica".
Ficava-lhe bem. Tinha boa planta e era um bom defesa-central.
Ao contrário da maioria que jogava mal e equipava como calhava.

Lembrou-se que tinha que tomar uma injecção de rotina, foi ao posto médico antes de rumar ao futebol.

Foi a última coisa que fez. Talvez reacção alérgica.

Enterrámo-lo no dia seguinte, num cemitério qualquer, algures na Zambézia.

Hoje lembro-me dos filmes norte-americanos, com toda aquela pompa, o dobrar da bandeira, as continências, o toque de silêncio.

Nós, tropa sempre mal-amanhada, também amarrotados e sujos pelo pó da picada, milicianos (militares improvisados) em tudo, até no ritual da morte, lá nos perfilámos e demos uns tiros para o ar. Sem pompa, mas com respeito. E raiva daquilo tudo.

Foi uma morte entre 9.000. E mais 30.000 mutilados.
A responsabilidade histórica, por enquanto, está solteira.
Branquear a história, por omissão ou deturpação, é grave. E perigoso.

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